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CORRIDA ESPACIAL E CORRIDA DE SEGUROS
Acadêmico: Antonio Penteado Mendonça
É surpreendente que nem Richard Branson nem Jeff Bezos se preocuparam em contratar seguros para proteger suas viagens ao espaço

Os recentes voos espaciais dos bilionários Richard Branson e Jeff Bezos, respectivamente controladores do grupo britânico Virgin e da norte-americana Amazon, além de tudo de lúdico, mágico e tecnológico envolvido, abrem uma nova área para o setor de seguros.

Imaginar que, em plena pandemia do coronavírus, o ser humano conseguiria dar uma demonstração indiscutível de sua capacidade de superação era algo pouco provável até pouco tempo atrás. Não era segredo que ambos estavam firmemente dispostos a abrir um novo capítulo na história da humanidade, oferecendo voos espaciais privados para, mediante o pagamento de uma pequena fortuna, levar os ricos que pudessem comprar a passagem para um voo de alguns minutos, além dos limites do planeta, entrando no espaço para ver a Terra de uma perspectiva inédita para a imensa maioria das pessoas.

Até agora, o planeta visto de fora era exclusividade dos astronautas das missões oficiais, bancadas por governos dispostos a explorar o cosmos, seguindo a longa tradição das viagens de descobrimento iniciadas pelos portugueses no século 14.

Desde Yuri Gagarin, todos os astronautas que viajaram para o espaço o fizeram em naves e cápsulas diretamente controladas pelos governos dos países mais desenvolvidos e com tecnologia e recursos suficientes para se lançarem à empreitada.

Com os dois voos em que tomaram parte dois dos homens mais ricos do planeta, este capítulo da história chega ao seu fim. A partir de agora, a iniciativa privada entra na corrida e isto tem de ser visto como um avanço extremamente importante, porque a iniciativa privada é mais ágil, menos burocratizada e, normalmente, mais eficiente do que a burocracia governamental.

É verdade que a iniciativa privada já participava da corrida espacial. A Space X, empresa do bilionário Elon Musk, fornece regularmente seus foguetes para a Nasa transportar e colocar em órbita diferentes tipos de equipamentos. O que mudou é que a partir de agora a iniciativa privada também é capaz de levar ao espaço seres humanos, tripulando seus objetos voadores de última geração.

O que é surpreendente, de acordo com matéria publicada pelo New York Times, que me foi enviada pelo jornalista Fernão Mesquita, é que nem Richard Branson, nem Jeff Bezos se preocuparam em contratar seguros para proteger suas viagens. Ao contrário, ao que parece, nenhuma delas tinha apólice garantindo o eventual insucesso da missão.

Não deixa de ser um risco calculado. Os dois têm fortuna capaz de suportar um acidente e fazer frente aos custos de um desastre que atinja seus foguetes tripulados em suas primeiras viagens para o espaço. Mas, com o aumento da frequência das viagens, tripuladas ou não, esse risco passa a ganhar outra dimensão e, evidentemente, em breve será segurado.

Seguros para garantir lançamentos de satélites não são novidade. Quer dizer, o assunto não é desconhecido das seguradoras, apenas os novos riscos, decorrentes dos dois voos recém realizados, nunca foram objetos de análise antes. E isto abre uma avenida de novas possibilidades para o setor de seguros expandir sua área de atuação.

A gama de variáveis envolvidas na operação, desde a fabricação dos foguetes e cápsulas espaciais até o retorno da missão em segurança para a Terra, é significativa e, mais uma vez, ressalta a importância e o potencial de danos dos riscos de responsabilidade civil.

Imagine um acidente com vítimas fatais em função de um problema num parafuso defeituoso instalado no foguete. A operadora do foguete responde em primeiro lugar pelas indenizações em função do acidente, sejam danos corporais, morais ou patrimoniais, mas ela tem direito de regresso contra o responsável pelo acidente, que é a fabricante do parafuso defeituoso.

Como as seguradoras já estão se debruçando sobre o assunto, em breve todos terão seguros e essa discussão será transferida para as seguradoras da operação do foguete e do fabricante do parafuso, desonerando e permitindo a continuidade das operações das empresas envolvidas.


Publicado no jornal O Estado de S. Paulo, 26 de julho de 2021.




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