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MEMÓRIA
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Acadêmico: Academia
FICARIA INCOMPLETA A RELAÇÃO dos acontecimentos daqueles dias agitados, se não mencionássemos a nota cômica da reforma, com o recebimento de um telegrama em espanhol, que de Buenos Aires enviou Aristeu Seixas, pondo à disposição da nova Diretoria a Cadeira n° 24, para maior facilidade na reformulação do quadro. De pequenas diferenças regionais da fala havia exemplos naquela agremiação de escritores paulistas, tendo sido o próprio Amadeu Amaral um dos primeiros estudiosos da matéria a chamar a atenção para o "dialeto caipira" das diversas áreas populacionais do nosso Estado; e na própria Capital, digamos, nos meios cultos, escritores havia que se distinguiam pelo acento característico do lisboeta ou dos estudantes de Coimbra, ou fosse por haverem sido educados em Portugal — seria o caso de Navarro de Andrade e poucos mais — ou simplesmente por contágio e elegância, sem a menor intenção humorística, mas sustentado com toda a seriedade pelo resto da vida. Porém, era caso virgem o esquecimento do português no curto prazo de dois anos de residência no estrangeiro. Nessas condições, como fora possível responder ao telegrama de Aristeu Seixas, para nos fazermos compreendidos? E como redigir à pressa algumas frases em castelhano, sem o perigo de cometer silabadas grossas a cada duas palavras, num documento dessa magnitude? Em tamanha perplexidade, toda cautela era pouca para não aumentar a confusão dos acadêmicos reunidos em sessão permanente. Por fim, predominou o bom senso, tendo sido lembrado o exemplo dos escritores bilíngües da Lusitânia, que tanto escreviam em castelhano da mais pura cepa como em português de casa. A jóia literária de D. Francisco Manuel de Melo, "El cerco de Cataluria", ainda é reeditada na Espanha, como peça de alto valor da sua historiografia. E para que lembrar os grandes escritores do Renascimento, quase todos bilíngües, e todos eles clássicos dos dois idiomas aparentados? Evidentemente, tais considerações não foram além de comentários nos bastidores, no entreato daquela representação; porque, ao fim e ao cabo, e para satisfação de todos, ficou o secretário Ulisses Paranhos autorizado a responder ao telegrama na língua que entendesse, para dizer ao Titular da Cadeira n° 24 que não lhe seria dado substituto por todo o tempo em que se encontrasse fora do Brasil. E tanto mais, que Ulisses Paranhos fizera o curso secundário em Buenos Aires, no Colégio Lacordaire, sendo de supor que ainda se recordasse da língua de Cervantes, mas que fosse para responder a um telegrama de cinco palavras. Na sua própria redação, na ata de 31 de maio: "O Sr. Presidente incumbiu o Sr. Secretário-Geral de responder ao telegrama, dizendo que o Sr. Aristeu Seixas é considerado de casa e benquisto de todos". Não há certeza, mas presume-se que o diligente Secretário-Geral redigiu a sua mensagem em português, o mais sonoros dos três idiomas neolatinos que ele dominava à perfeição. É que ninguém punha em dúvida a capacidade do poeta de "Pôr do Sol" para entender, naquela altura, a mensagem cordial da Pátria distante. Desse modo ficou solucionada a intricada questão dos "ausentes", com desgaste mínimo de três acadêmicos da primitiva composição. Ainda assim, pequenos resmungos se fizeram ouvir ao cair do pano desta sessão verdadeiramente crítica da história da Academia, de uns poucos que, "por princípio" não aprovavam a solução vitoriosa, o que não impediu, aliás, de receberem de braços abertos os novos acadêmicos. Eram os adeptos da ideia várias vezes aprovada, porém nunca levada a sério, de aumentarem o número das Cadeiras para cinqüenta. A partir da 9ª sessão — 16 de maio — a Academia funcionou regularmente, com boa freqüência, planos para a publicação de uma Revista, programas de conferências públicas, telegramas e votos de pesar. Só houve divergência com relação à maneira de empossar os quinze novos acadêmicos, parecendo a alguns que se fossem realizadas no Teatro Municipal, tantas festas seguidas "podiam fazer mal à Academia". Parecer de médico, certamente; é sempre grande o número de médicos nas academias literárias, acostumados como estão a aconselhar a seus clientes moderação na dieta. Por fim, prevaleceu a ideia de serem empossados todos os acadêmicos de uma só vez, o que foi feito no dia 31 de julho (1929); o acadêmico Spencer Vampré incumbiu-se de saudá-los. A 15ª sessão, de 27 de agosto do mesmo ano ainda foi presidida por Amadeu Amaral; mas, na seguinte, a 14 de outubro, Ulisses Paranhos assumiu a presidência, dando cumprimento às determinações constantes de uma carta do Presidente, lida no plenário, "para não haver longa interrupção nas sessões da Academia". Pois, muito embora fosse animador o seu estado geral, concluía o missivista, a "fraqueza era extrema e a enfermidade exigia longo período de tratamento". Até no leito da morte, com o espírito lúcido, preocupava-se Amadeu Amaral com a sua querida Academia. E no dia do seu falecimento, a 4 de outubro, numa convocação extraordinária dos acadêmicos foi aprovada proposta da Mesa, com a indicação das homenagens a serem prestadas à memória do Presidente Amadeu Amaral, que acabara de falecer: a) A Academia tomará luto por oito dias; b) nomear uma comissão que a represente nos funerais e apresente condolências à família; c) enviar uma coroa de flores, que será colocada no túmulo; d) expedir um telegrama de pêsames à Academia Brasileira de Letras; e) promover uma sessão de saudades em sua homenagem. O acadêmico Spencer Vampré foi designado para proferir algumas palavras à beira do túmulo, e Aristeu Seixas, para falar na sessão de saudade. Por último, no dia 11 de novembro — 18ª sessão da nova Academia — foi eleito por 18 votos Alcântara Machado para a Presidência do sodalício, e na mesma sessão, também por 18 votos, eleito Altino Arantes para a poltrona n, 33, que tem como patrono Teófilo Dias, então vaga com o falecimento de Amadeu Amaral. voltar |
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