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![]() Acadêmico: José Renato Nalini De nada adianta acumular bens que não nos acompanharão na viagem definitiva, para a qual nada se leva, senão o bem que se faz. E o momento presente é aquele em que o planeta mais necessita de carinho e cuidados
Siga o exemplo A duração de uma existência humana individualizada é efêmera. Algumas décadas, não mais. É o período em que se nasce, cresce, trabalha, envelhece e morre. Muitos são os que conseguem fazer fortuna e, ao morrerem, deixam conflitos. Famílias se desintegram. Irmãos deixam de se falar. Tudo por causa do patrimônio. Se as pessoas tivessem noção da brevidade da vida e da inutilidade de acumular bens que ficam aí, para a disputa no espólio, talvez os gestos nobres se multiplicassem. Mas ainda restam bons exemplos a serem seguidos. Um deles é a propriedade agrícola de 3.686 hectares, localizada em Londrina, chamada “Fazenda Figueira”, hoje sediando a Estação Experimental Agrozootécnica Hildegard Georgina Von Pritzelwitz, que foi doada em 2000 para a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz. O doador foi o engenheiro agrônomo e ex-aluno da Esalq da USP, Alexandre Von Pritzelwitz, que entendeu ser útil a criação de um centro de estudos e que se converteu em auspiciosa realidade. A fazenda abriga cinco mil cabeças de gado e realiza melhoramento genético do rebanho, além de promover estudos pertinentes a essa atividade. Em duas décadas, houve nítido acrescentamento das técnicas que atendem a pesquisadores, pesquisadores, produtores, zootecnistas, veterinários e acadêmicos. Os estudos técnicos foram validados com estudos científicos e com indicadores comprobatórios do êxito das iniciativas. Mais de oitenta teses de doutorado e dissertações de mestrado foram ali elaboradas até 2020, o que foi possível porque a doação foi condicionada à manutenção da pecuária de corte e destinação da renda destinada ao desenvolvimento de estudos científicos e avanço tecnológico. As práticas já comprovadas são disseminadas para o setor e isso garante notável melhoria da pecuária, não só na região, mas em todo o Brasil. A fazenda mantém parcerias com instituições de pesquisa e empresas e serve como parâmetro para a ação de outros produtores e para crescente aprimoramento de práticas sustentáveis. Situada a cinquenta quilômetros do centro de Londrina, dos seus quase três mil e setecentos hectares, quarenta por cento são destinados à preservação ambiental. A maior parte da área é composta pela Mata do Barão, com mil, cento e vinte e seis hectares de Mata Atlântica averbados pelo próprio proprietário, em caráter de perpetuidade, como Reserva Particular do Patrimônio Natural, a maior do município de Londrina. A propriedade rural foi adquirida em 1942 pelo pai de Alexandre, o alemão Kurt Gustav Von Pritzelwitz, conhecido como “Barão”, título honorífico simbólico transmitido ao filho. Ele chegou da Alemanha em 1921 para trabalhar com o comércio e exportação de café em Santos. Como Londrina era importante praça formadora do preço do grão, houve natural interesse por possuir fazenda de café própria. A geada de 1975 impactou as lavouras de café e a atividade principal da Figueira passou a ser a pecuária de corte. Em 1995 Alexandre lavrou a escritura de doação e, com seu falecimento, em 5 de janeiro de 2000, ela se efetivou. Suas exigências: fosse mantida a pecuária de corte, para financiar a estação experimental, que deveria levar o nome de sua mãe, Hildegard Georgina Von Pritzelwitz e que a administração fosse autossustentável. Também dispôs que as atividades tivessem aval e acompanhamento de uma comissão de professores do Departamento de Zootecnia da Esalq, com os quais ele se relacionava desde que era aluno, na década de 1940. Esse é um belo exemplo de altruísmo e de desapego à propriedade imobiliária, que é um direito fundamental de primeira geração, explicitado no caput do artigo 5º da Constituição de 1988. Deveria ser acompanhado por tantos outros fazendeiros que constroem belos empreendimentos que, após sua morte, chegam a ser totalmente desfigurados por herdeiros famélicos de converterem sonhos paternos em cifrão. Como o mundo seria melhor se houvera menos egoísmo e consciência de que a vida é muito breve. De nada adianta acumular bens que não nos acompanharão na viagem definitiva, para a qual nada se leva, senão o bem que se faz. E o momento presente é aquele em que o planeta mais necessita de carinho e cuidados. E de mais doações condicionadas à preservação da natureza. Publicado no Estadão/Blog do Fausto Macedo, em 10 04 2025 ![]() ![]() |
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