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POLÍTICA PAULISTA PREGRESSA
Acadêmico: José Renato Nalini
Armando Salles de Oliveira foi um político de mãos limpas. Nunca deixou que houvesse confusão entre sua economia particular e a do governo.

Política paulista pregressa

O exercício da política partidária não é uma arte que frui de uníssono reconhecimento. Ao contrário, todas as pesquisas evidenciam o descrédito que esse mister arrebanhou, mercê de deprimentes condutas. Hoje, para se dedicar a ela, é preciso não ter o que perder.

Mas nem sempre foi assim. Houve tempo em que havia homens probos, honestos até o seu íntimo, devotados à causa pública. Realmente interessados em atuar para a consecução do bem comum.

Um desses homens foi Armando de Salles Oliveira. Casou-se com Raquel de Mesquita, que lhe daria três filhos: Armando, Júlio e Lucila. Tão unido o casal, que “cinco anos após a morte de seu marido, contados mês a mês, dia a dia, foi D. Raquel Mesquita de Salles Oliveira para o túmulo, atingida também pelos padecimentos do exílio que, cruelmente, se estendem, como uma fatalidade, sobre a família do desterrado”.

Sim, Armando de Salles Oliveira, primeiro interventor, depois governador eleito de São Paulo, foi banido. Genro de Júlio Mesquita, o combativo e corajoso jornalista de “O Estado de São Paulo”, foi verdadeiro amigo do sogro. Quando já era governador, Armando, ao discursar em Campinas, lembrou-se das lições de civismo legadas por Júlio Mesquita: “Foi Júlio Mesquita um excepcional condutor de homens. Quem reunirá as dedicações ilimitadas que ele inspirou e sem as quais não se forma o verdadeiro chefe? Souberam o que é um chefe os que na tarde da morte lhe viram os amigos, ajoelhados à volta de seu leito, recolherem as últimas faíscas daquele grande espírito e daquela indomável energia. O grupo que dele recebeu a pesada herança intelectual e moral não se esquece da sua palavra e de seus exemplos. A sua pena era vigorosa e ágil, mas o punho de aço que a manejava detinha-se no mais rude da luta para não ultrapassar a linha em que começariam a ser feridos os melindres pessoais”.

Por integrar a família de Júlio Mesquita, o genro Armando de Salles Oliveira teria todas as condições de se valer de “O Estado de São Paulo” para se tornar conhecido e angariar a simpatia de futuros eleitores. Mas o não fez. Nunca teve pressa em aparecer. Ficou à sombra, a estudar, a trabalhar e a preparar-se. Como engenheiro, sabia não existir construção duradoura sem alicerces sólidos.

Foi um político de mãos limpas. Nunca deixou que houvesse confusão entre sua economia particular e a do governo. Mostrou-se de caráter inquebrantável na Revolução Constitucionalista de 1932. Sobre sua conduta então, Plínio Barreto é eloquente: “Coordenador das energias que se ofereciam para o combate contra os erros e os vícios da política de então, adquiriu logo a confiança geral. Mas a sua capacidade de organização e a sua predisposição para o mando, os seus atributos de chefe, as suas excelências de guia só tomaram relevo em 1932, na campanha em que São Paulo arriscou tudo, a começar pela vida dos seus filhos, para restaurar, no Brasil, o regime da lei. Do seu gabinete de trabalho, na redação do “Estado”, transformada em posto de comando, Armando dirigia tudo quanto lhe cabia dirigir, distribuía conselhos, tomava providências, provia ao que a sua vigilância exigia, levantava os ânimos, distribuía esperanças. Foram dias e noites terríveis”.

Armando acabara de recusar a pasta da Fazenda, no Secretariado de 23 de maio. Quem relata o episódio é o grande Professor Waldemar Ferreira: “Para que se tenha a impressão do que era, e foi Armando de Salles Oliveira como homem público e de como seguiu ele o conceito josebonifaciano de que a sã política é filha da moral e da razão, assinalo um fato: ao constituir-se o Secretariado, com que a Frente Única política de São Paulo entraria a coparticipar do governo Pedro de Toledo, em 1932, designou o Partido Democrático três dos seus componentes para as pastas da Justiça e da Segurança Púbica, da Viação e Obras Públicas e da Fazenda. Coube-me a primeira e dela me empossei, sob os aplausos do povo paulista, na noite de 23 de maio. Tocou a segunda a Francisco Emidio da Fonseca Teles. Destinou-se a terceira a Armando de Salles Oliveira. Lavrados os respectivos decretos de nomeação, procurei a este para empossar-se no cargo. Com surpresa, recusou-o. julgava-se impedido de exercê-lo, por circunstância que denunciou. É que a grande empresa jornalística a que presidia e editava o grande matutino paulista, em que Júlio Mesquita traçou o seu perfil de jornalista incomparável, se achava em relações de negócio com o Banco do Estado de São Paulo. Sendo este subordinado à Secretaria da Fazenda, julgava-se impossibilitado, sem quebra do imperativo de melhor ética, de ocupa-la. Declinou, por isso, do encargo que, de outro modo, desempenharia, consciente de sua obrigação de bem servir a sua terra e a sua gente”.

Essa consciência ética irrepreensível, onde é que foi parar?

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão
Em 31 08 2023



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