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QUEM PASSOU PELA VIDA EM BRANCA NUVEM
Acadêmico: José Renato Nalini
As composições poéticas de Francisco Otaviano de Almeida Rosa não são tantas, mas todas elas de alto valor e enorme repercussão.

Quem passou pela vida em branca nuvem


...e em plácido repouso adormeceu! Quem não sentiu o frio da desgraça, quem passou pela vida e não sofreu. Foi espectro de homem, não foi homem. Só passou pela vida, não viveu!".

Versos de Francisco Otaviano de Almeida Rosa, um fluminense nascido na Corte, a 26 de junho de 1822, ano em que Pedro I declarou a independência do Brasil. Hélio Lobo, no artigo "O cantor que venceu as sereias", escreveu: "Numa modesta casa da rua do Carmo, hoje Uruguaiana, Rio de Janeiro, nascia de um casal de gente de cor, Francisco Otaviano de Almeida Rosa. Do pai, Otaviano Maria da Rosa, ficou a tradição de médico ilustre e cidadão honrado. A mãe, malgrado recursos parcos e as penas de um reumatismo crônico, não deixou nunca de atender à educação do filho".

Para gáudio de São Paulo, Francisco Otaviano cursou a São Francisco, de 1841 a 1845. Almeida Nogueira é pródigo ao elogiá-lo: "que dizermos que não seja conhecido e notório a respeito da sua prodigiosa e agudíssima inteligência, do seu primoroso talento de escritor, da magia do seu estilo, da sua musa sentimental, da sua amável e encantadora causerie?".

Foi um aluno atento e dedicado de Manuel Joaquim do Amaral Gurgel e era colega de Martim Francisco e de José Bonifácio, o Moço. Mas conciliava o estudo com a poesia e com a redação de artigos publicados no "Jornal do Comércio". É considerado o introdutor, na imprensa da época, do folhetim ligeiro, insinuante. Também foi prolífico epistológrafo, com cartas de 1844 a 1888, que reproduzem o ambiente político, social e intelectual do Segundo Império.

Diretor e Redator do Diário Oficial, a partir de 1848, foi também Secretário da Província do Rio de Janeiro, deputado à Assembleia Geral da 9ª à 12ª legislaturas. Por ocasião da Guerra com o Paraguai, foi encarregado de celebrar com a Argentina e o Uruguai o Tratado da Tríplice Aliança.

Em 1866, a Província do Rio incluiu-o na lista sêxtupla para o Senado. Foi um dos escolhidos, mas não demonstrou grande apetite pelo poder. Casou-se com Eponina Moniz Barreto, que muito influenciou sua vida e obra. O lar de ambos era centro de atração e procurado por artistas, políticos, jornalistas, todos muito bem acolhidos em fidalgas recepções.

Suas composições poéticas não são tantas, mas todas elas de alto valor e enorme repercussão.

Um soneto que nas escolas é sempre repetido, é o

Morrer, dormir, não mais: termina a vida

E com ela terminam nossas dores.

Um punhado de terra, algumas flores.

E, às vezes, uma lágrima fingida!

Sim, minha morte não será sentida,

Não deixo amigos e nem tive amores!

Ou, se os tive, mostraram-se traidores,

Algozes vis de uma alma consumida.

Tudo é pobre no mundo; que me importa

Que ele amanhã se esboroe e que desabe,

Se a natureza, para mim, está morta?

É tempo já que o meu exílio acabe;

Vem, pois, ó morte, ao nada me transporta!

Morrer, dormir, talvez sonhar, quem sabe!

Essa confissão velada: "nem tive amores; ou, se os tive, mostraram-se traidores", foi confirmada por Couto Magalhães na "Revista Acadêmica" de 1859: "Numa casa da rua do Ouvidor, desta cidade, existia, ainda o ano passado, escrita na parede, uma bela poesia deste escritor, que começa assim: "Oh! Se te amei! Toda a manhã da vida/Gastei em sonhos, que de ti falavam; /Nas estrelas do céu lia o teu nome,/Ouvia-te nas brisas que passavam".

Sabe-se até mesmo quem era o amor de Francisco Otaviano. Uma bela jovem, filha de médico famoso na Corte. Contratou casamento com um inglês muito rico. Otaviano foi se despedir dela e, convidado a deixar em seu álbum uma lembrança, escreveu, de improviso, o poema "C'est fini!", que termina com um lamento: "Sem fé, sem amor, sem glória/ Que direito posso ter/Para meu nome inscrever/Em tão formoso sacrário?/ Raspai, senhora, depressa/Esta página perdida:/A história de minha vida/Não profane um santuário."

Francisco Otaviano, que nascera junto com a Independência, faleceu no Rio de Janeiro, no ano da proclamação da República.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão
Em 21 06 2023



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