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SEM EDUCAÇÃO, SEM DEMOCRACIA
Acadêmico: José Renato Nalini
Uma nação incapaz de obter consensos e inerte perante o caos e a fome

Sem educação, sem democracia

A fragílima democracia tupiniquim tem uma causa explícita: a falta de educação de qualidade. Escola não é apenas vacina e vitamina para a verminose democrática. É oxigênio, sem o qual não há sociedade decente.

Não faltaram brasileiros lúcidos, educadores como Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo e Paulo Freire, os primeiros esquecidos, o último vilipendiado. Eram estudiosos antenados com o que de mais avançado se pensava sobre educação. Nítida a influência de John Dewey na prática dos que pretenderam prover o Brasil de uma escola consequente com as urgências nacionais.

O americano John Dewey (1859-1952) viveu 93 anos e assistiu a duas Guerras Mundiais, e isso aumentou sua crença na escola para evitar a violência. Sua origem é a classe-média americana, a mãe educadora que o tornou contumaz leitor e ávido por conhecimento. Sem ela, não teria chegado à Universidade. Teve educação à moda europeia, que infelizmente não vingou no Brasil, e ofereceu a ele a prática rotineira das ocupações domésticas. Arrumava sua cama, fazia faxina em casa, lavava e passava roupa. Ajudava a mãe na cozinha. Isso que a classe média brasileira não faz com seus filhos, explica, em boa parte, o machismo e os demais preconceitos, que a muito custo as novas gerações vão domando.

Lúcida, a mãe de Dewey enxergava a educação formal, a escolarização que apenas adestra o educando a decorar informações, como inteiramente desconectada com a realidade. Escola não servia para a vida, como continua a não servir em pleno século 21. Por isso, nutria a convicção de que o mais importante em sua formação, antes de ingressar na Universidade, adquiriu fora da sala de aula. E isso refletiu-se em sua obra. As atividades ocupacionais integram o melhor conceito de educação. Se todas as crianças fossem iniciadas nessas práticas, a sociedade brasileira seria menos violenta, menos desigual, menos preconceituosa.

John Dewey foi professor secundarista na Pensilvânia, por isso a sua autoridade ao falar sobre educação. Muito diferente dos "especialistas" que opinam na mídia, são chamados para debates, vendem vultosas consultorias para um Estado que não tem noção do que seja educação e nunca enfrentaram uma sala de aula. Dewey concluiu a pós-graduação, especializou-se, escreveu, mas nunca se afastou das classes. Manteve contínuo contato com legiões de alunos. Atuou como professor durante 55 anos, aposentando-se em 1939.

Influenciado pelo darwinismo, conferiu enfoque naturalista à sua produção teórica, mas com preocupação eminentemente prática. Foi considerado herdeiro do pragmatismo, abeberando-se das duas fontes originais: Peirce e William James. Mas imprimiu sua formulação própria, aproveitando de Peirce a lógica e de James a preocupação com a educação consistente das novas gerações. Com isso, desenvolveu um pragmatismo pedagógico apto a entrelaçar valores cognitivos, éticos e sociais.

Sustentou o "melhorismo", a imposição de consciência a formar a mocidade à luz do idealismo moral, sempre a indagar se esta é a melhor forma de realizar as atividades, desenvolver iniciativas, tratar com os semelhantes ou se nosso comportamento admite passos ascendentes, rumo a uma talvez utópica perfeição. Esta, por ser inatingível, não pode ocasionar a eliminação da crença na perfectibilidade dos humanos.

Melhor fariam os políticos, em lugar de se dedicarem a orçamentos secretos e a "Fundões", se voltassem para a leitura de livros de Dewey, como "Teoria da vida moral", "Como pensamos" e "Democracia e Educação". Para que o Brasil conte com adultos capazes, a educação formal e informal deve propiciar aos alunos valores sociais como a honestidade, a amabilidade, a perseverança e a lealdade. E aprendessem a priorizar valores estéticos da literatura, da pintura, da música, do cinema e da fotografia. Absorveriam, com naturalidade, o regramento da sustentabilidade de tais valores: seriam éticos, harmônicos e equilibrados. Tudo aquilo que falta hoje à Nação brasileira, imersa em ferrenhos antagonismos, incapaz de obter consensos e inerte perante o caos ambiental, a violência e a fome.

Publicado no Jornal de Jundiaí/Opinião
Em 20 03 2022





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