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DESAFIOS AMAZÔNICOS
Acadêmico: José Renato Nalini
Algo que deveria movimentar todas as pessoas e entidades que antigamente se denominavam "forças vivas" da sociedade, é a política da regularização fundiária.

Desafios amazônicos

Se o maior risco imposto à humanidade é o aquecimento global, o Brasil é um dos países na alça de mira do mundo consciente dos perigos contemporâneos. Porque a Amazônia é o bioma de maior relevância para o passo atrás imprescindível à mitigação dos efeitos das mutações climáticas.

Não é só o Brasil que precisa da floresta. É o planeta inteiro. Daí não ser importante assegurar a soberania tupiniquim sobre um bioma de que o mundo inteiro necessita. O conceito de soberania já foi extremamente relativizado e nenhum país pode se arrogar a prerrogativa de não depender de mais ninguém. Basta olhar a desenvoltura com que a ilicitude tomou conta do globo. O tráfico de drogas, de armas e de pessoas não pede licença a governo algum. Assim como a chuva ácida, a poluição, as "ilhas" de pet que circundam os mares. Tudo isso deveria trazer mais humildade a todos, consciência de sua insignificância diante da dimensão dos problemas e da necessidade de união, em vez de separação e fragmentação.

Verdade que a maior parcela da última grande floresta tropical da Terra encontra-se no Brasil. Mas verdade, também, que o Brasil desconhece a Amazônia. Deixa que a criminalidade apátrida controle seu garimpo, acabe com a vegetação que levou milênios para cobrir aquela região que, sem a cobertura da flora, se transformará muito cedo num deserto. Basta contornar a esfera terrestre (Sim, terraplanistas: o planeta é uma esfera, não uma pizza...) e verificar o que se encontra do outro lado.

Por ignorância, o brasileiro não sabe que a fonte ainda inesgotável de recursos financeiros está naquela parte do país. No momento em que se avaliar o potencial de crédito de carbono disponível, as cotas de reserva florestal, a biodiversidade ainda não suficientemente explorada, para a indústria química, farmacêutica, de estética e de alimentação, o Brasil ganhará pontos naquilo que ainda é considerada a "salvação da lavoura": a sua agricultura.

Também temos compromisso com as etnias que praticamente liquidamos nos quinhentos anos de colonização cruel. Muito a aprender com os indígenas, detentores de uma cultura tradicional que encontra a cura para muitos males e prevenção para tantos outros. Claude Lévi-Strauss já havia mostrado que os indígenas cultivaram saberes longevos, solidificados e consolidados em milênios de vida distanciada do que parte da sociedade humana, aquela que se localizou no Ocidente, convencionou chamar de "civilização".

O projeto amazônico deveria envolver Estado e sociedade. Sem exclusão de ninguém. O Estado, para fazer um recenseamento diverso daquele que o IBGE realiza. Algo mais consistente, que apurasse a real situação da população que ali reside e não desistiu de continuar a viver.

Depois, cuidar de capacitar as novas gerações para as missões ainda disponíveis e carentes de quadros qualificados. Biologia, engenharia florestal, botânica, agronomia, tecnólogos para todas as áreas abertas à exploração, hoje ainda inexistente ou incipiente.

Levantamento exato da riqueza que ali existe em termos de flora, fauna, recursos minerais, potencialidades turísticas, pois o mundo tem curiosidade sobre o ambiente verde tão ignorado e tão convidativo.

A Universidade precisaria estabelecer campus naquela área, para propiciar aprendizado naquilo que já existe e para suscitar novas atividades a partir das descobertas que a ciência e sua serva, a tecnologia, propiciarão à juventude sequiosa por oportunidades compatíveis com a Quarta Revolução Industrial.

Algo que deveria movimentar todas as pessoas e entidades que antigamente se denominavam "forças vivas" da sociedade, é a política da regularização fundiária. Sem ela, difícil descobrir quais as áreas públicas sequestradas pelo crime organizado e suscetíveis à destruição da mata e ao garimpo ilegal. É uma política humanitária, antes de ser registral ou jurídica. Uma questão de cidadania, de inclusão e de redução das vergonhosas desigualdades entre os brasileiros.

Sem o tratamento consentâneo com a dimensão das questões que envolvem a Amazônia, não haverá condições de o Brasil assumir o seu pioneirismo de grande nação, apta a oferecer à sua população o nível existencial desejável e prometido pelo constituinte, que se comprometeu a edificar uma pátria livre, justa, fraterna e solidária.

Publicado no Blog do Fausto Macedo/Estadão/Opinião
Em 23 12 2022



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